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Vivemos na era da conveniência absoluta. Comida? Chega à porta em 15 minutos. Conhecimento? O Google responde em 0,3 segundos. Afeto? Uma enxurrada de corações no Instagram basta. Tudo está à distância de um clique — e, no entanto, nunca fomos tão prisioneiros. Prisioneiros da nossa própria preguiça, da rotina entorpecedora, da ilusão de que "estar confortável" é sinónimo de "estar vivo".  

O "Acomodado da Silva" é o herói involuntário deste tempo. Ele acorda no mesmo horário, segue o mesmo trajecto, mastiga as mesmas queixas no café, e repete, como um mantra moderno "Está bom assim." Não lê, não explora, não questiona. A sua maior aventura é percorrer o labirinto dos stories do Facebook até encontrar um meme que justifique o seu imobilismo. E, pior: acha que isto é liberdade.  

A tecnologia prometia-nos asas, mas deu-nos um sofá. Porquê sair para ver o mundo se o mundo cabe num ecrã de 6 polegadas? Porquê sujar as mãos a aprender carpintaria quando há tutoriais em velocidade 2x? O comodismo disfarça-se de eficiência, e o sedentarismo — físico e mental — torna-se um vício elegante. Até a curiosidade morreu soterrada sob o algoritmo que só nos mostra o que já sabemos (e já gostamos).  

O Silva não odeia a sua vida; ele apenas a tolera. Segunda a sexta é um loop de acordar-trabalhar-jantar-dormir, com pausas para scrollar até adormecer. O fim de semana? Um vago "descansar" que se traduz em horas perdidas em séries que nem sequer o emocionam. A rotina não é má por natureza — é má quando se transforma numa cela sem grades, onde o prisioneiro nem sente falta da chave.  

O pior do comodismo é a sua capacidade de se justificar. "Não sou ambicioso, sou realista", diz o Silva, enquanto enterra sonhos sob a desculpa do "não é para mim". "A vida já é dura, para quê complicar?" — e assim se normaliza a mediocridade. Esquecemo-nos de que o conforto excessivo é um travão, não um prémio. A história não se escreve com quem esperou; escreve-se com quem ousou sair da fila dos resignados.  

E como escapar da prisão invisível ?

1. Trocar o "está bom" por "e se?"

   E se aprendesses algo novo só por prazer? E se, em vez do takeaway, cozinhasses uma receita que nunca tentaste?  

2. Fugir ao Piloto Automático 

   Quebrar pequenas rotinas — um caminho diferente para o trabalho, uma conversa com um estranho — já é rebeldia contra o comodismo.  

3. Abraçar o Desconforto  

   O crescimento começa onde o conforto acaba. Inscreve-te naquela aula de dança, vai sozinho a uma exposição, lê um livro que te desafie.  

4. Desligar para Recomeçar 

   Um dia por semana sem redes sociais. Sim, parece um pânico. É precisamente por isso que deves fazê-lo.  

O comodismo não é preguiça; é medo disfarçado de racionalidade. E o mundo actual, com todas as suas facilidades, é o cúmplice perfeito. Mas a verdade é esta: a vida não acontece no ecrã, nem no sofá, nem na zona de conforto. Acontece lá fora, onde há riscos, erros, descobertas — e, sim, onde por vezes se falha. Mas falhar a tentar é sempre mais nobre do que acertar por não fazer nada.  

O Silva que se cuide. A prisão tem portas abertas; basta decidir sair.

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publicado às 15:00

Livres são as Ideias, Sagrado é o Nome

por LucyHare, em 13.07.25

 

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Já por algumas vezes me perguntaram por que não publico fotos ou falo da minha vida nas redes sociais quando sou tão ativa nelas.. Digamos que tenho a dimensão pessoal da minha vida num altar que gosto de ser única a venerar. Digamos também que a minha presença nas redes sociais é um acto de rebeldia silenciosa. 

Vivemos num mundo que transforma a vida privada em espetáculo, e eu escolho guardar o que é meu — os rostos, os nomes, os dias comuns que são tudo menos banais. Recuso-me a alimentar a máquina de Zuckerberg e dos outros que, como Shoshana Zuboff bem denuncia, transformam cada detalhe nosso em produto. Não lhes dou esse poder.

Contudo, eu não me calo. Partilho ideias, convicções, fragmentos do que penso — e isso, sim, é a minha forma de resistência. Sartre diria que sou condenada à liberdade, e eu assumo essa sentença com orgulho: escolho o que liberto no mundo digital, recuso-me a ser mais uma na engrenagem. As minhas palavras são armas, mas a minha intimidade não está à venda.

Byung-Chul Han fala da sociedade do cansaço, dessa necessidade doentia de nos expormos até à exaustão. Eu recuso-me a esse desgaste. Os meus pensamentos circulam livres, sem o peso dos contextos pessoais, porque o que importa não é quem os vive, mas o que eles dizem. Sou uma flâneur digital, observo o frenesim das redes sem me deixar engolir por ele.

Há quem não entenda. Há quem pense que reserva é distância. Mas eu sei que é o contrário: ao guardar o pessoal para o presencial, lembro-me — e a quem me lê — que há coisas que não se digitalizam. Um olhar, um silêncio partilhado, um riso que ecoa numa sala. Nada disso cabe num ecrã.

E é assim que resisto: habitando as redes sem lhes entregar a minha alma. Não sou contra elas, sou contra a ideia de que temos de nos esvaziar para sermos vistos. A minha privacidade não é medo — é um território sagrado. E ninguém, nenhum algoritmo, tem direito a invadi-lo.

Por isso continuo: ideias sim, intimidade não. E se isso faz de mim uma estranha no mundo digital, então que assim seja. Prefiro ser estranha do que ser espelho.

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publicado às 20:22

A Ditadura sem Rosto

por LucyHare, em 11.07.25

Quando o Autoritarismo se Veste de Democracia

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Nenhum ditador do século XXI precisa, obrigatoriamente, de um uniforme militar, de um bigode histriónico ou de discursos inflamados a partir de uma varanda. O autoritarismo aprendeu a andar de fato e gravata, a sorrir para as câmaras e a falar em nome da "vontade do povo" enquanto silencia, aos poucos, os mecanismos que poderiam contestá-lo. Vivemos numa época em que a democracia se tornou, muitas vezes, uma capa — um invólucro vazio que esconde o velho vício do poder absoluto, agora exercido com métodos mais subtis, mas não menos perigosos.  

A história ensina-nos que as ditaduras clássicas caíram, uma após outra, como estátuas derrubadas pela força da resistência ou pela própria decadência interna. Hitler suicidou-se num bunker, Mussolini pendurado pelos pés, Ceaușescu executado após um julgamento sumário. Mas o que acontece quando o autoritarismo já não precisa de tanques nas ruas, quando já não depende da censura brutal porque controla os algoritmos que definem o que vemos? Quando já não prende jornalistas, mas compra os meios de comunicação ou domina as redes sociais com exércitos de bots?  

A resposta está à nossa frente, todos os dias, nas democracias que funcionam como fachadas. São países com eleições, mas onde o poder judicial é instrumentalizado para perseguir adversários políticos. Onde os parlamentos existem, mas as decisões importantes são tomadas em salas fechadas por tecnocratas não eleitos. Onde a imprensa é livre, mas pertence a meia dúzia de magnatas que definem a narrativa. Onde os cidadãos são vigiados, não por polícias secretas, mas por telemóveis que rastreiam cada movimento, cada pesquisa, cada desvio de opinião.  

E, no entanto, o mais perturbador não é a existência deste novo autoritarismo. É a forma como nos habituámos a ele. Como aceitamos, sem grande protesto, que a privacidade seja um luxo do passado. Como normalizamos que certos políticos estejam acima da lei, desde que nos digam que é para "nosso bem". Como interiorizámos que a desigualdade é inevitável, que a justiça é para alguns, que a voz do povo só deve ser ouvida quando não incomoda os de sempre.  

O filósofo Byung-Chul Han avisou: já não vivemos numa sociedade disciplinar, mas numa sociedade de desempenho. Já não somos reprimidos por um Grande Irmão, mas exploramos a nós próprios, convencidos de que a culpa dos nossos fracassos é só nossa. O sistema já não precisa de nos oprimir — nós mesmos nos censuramos, temendo o julgamento das redes sociais, a exclusão do mercado, o ostracismo político. E, assim, o autoritarismo moderno dispensa campos de concentração: basta-nos a prisão mental da dívida, do medo do desemprego, da vergonha de sermos "incorretos".  

Mas há uma luz nesta escuridão: nenhum poder, por mais bem disfarçado que esteja, é eterno. As ditaduras do século XX caíram, não porque fossem frágeis, mas porque a mentira tem prazo de validade. Mais cedo ou mais tarde, a realidade rebenta as costuras da ficção. Um dia, os cidadãos acordam e percebem que lhes venderam liberdade em troca de segurança ilusória. Que lhes prometeram prosperidade e só lhes deram precariedade. Que lhes disseram que viviam numa democracia, mas o voto já não muda nada.  

E é aí que o dominó começa a tombar outra vez.  

A questão não é se o autoritarismo moderno vai cair. A questão é quanto tempo vamos demorar a perceber que ele já está aqui — e que, tal como no passado, só resistirá enquanto lhe fizermos o jogo.

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publicado às 07:29

A Inclusão torna-se Espetáculo

por LucyHare, em 10.07.25

Ainda na sequência do meu artigo anterior, sobre a Cultura do Coitadinho e a Vitimização como arma ideológica,  falo agora sobre a Inclusão. Quando esta se torna espetáculo.

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A notícia da nova Barbie com diabetes tipo 1, anunciada com pompa e circunstância pela Mattel sob o lema "para maior inclusão e empatia", serve como perfeita ilustração deste nosso tempo. Não se discute aqui a importância de representar condições médicas reais - isso seria absurdo. Questiona-se, sim, a transformação da diversidade em espetáculo, onde cada particularidade humana precisa ser convertida em produto de consumo emocionalmente palatável.  

Esta boneca-diabética, apresentada como marco progressista, revela precisamente a contradição da nossa era: enquanto celebramos a diferença como conceito abstrato, perdemos a capacidade de lidar com ela na sua complexidade real. A Mattel, empresa que durante décadas vendeu padrões de beleza irreais, agora capitaliza a "inclusão" como estratégia de marketing - e somos todos convidados a aplaudir o gesto como se fosse pura filantropia.  

O fenómeno repete-se em todas as esferas: na política, onde partidos transformam minorias em peças de xadrez moral; na cultura, onde histórias de superação se tornam produtos descartáveis de consumo emocional; no discurso público, onde a empatia performativa substitui a ação concreta. Criamos uma sociedade obcecada por símbolos e alheia a substâncias, onde o que importa não é resolver problemas, mas sim exibi-los como medalhas de virtude.  

A criança com diabetes não precisa de uma boneca que espelhe a sua condição - precisa de acesso a medicamentos, de apoio médico consistente, de uma sociedade que a trate com normalidade, não como peça de museu da diversidade. Mas essa abordagem exigiria mudanças estruturais incómodas, enquanto a Barbie inclusiva oferece a solução fácil: a ilusão de representação como substituto para a verdadeira igualdade.  

Este caso exemplifica como a indústria da "empatia" transformou vulnerabilidades reais em mercadoria. Não se trata de inclusão - trata-se de capitalizar a diferença, reduzindo experiências humanas complexas a acessórios de marketing. A verdadeira aceitação não vem de bonecas com diagnósticos, mas de um mundo onde essas diferenças deixem de ser motivo para espetáculo - porque foram normalizadas na prática, não apenas no discurso.  

Enquanto aplaudimos estes gestos simbólicos, perguntemo-nos: estamos mesmo a construir uma sociedade mais inclusiva, ou apenas a criar novas formas de explorar a diferença? A resposta, como a insulina da Barbie, não vem incluída na embalagem.

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publicado às 07:03

Seculo XXI e a Cultura do Coitadinho.

por LucyHare, em 10.07.25

Quando a Vitimização se torna arma ideológica

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Vivemos tempos estranhos. Tempos em que a dor, outrora silenciada, ganhou voz — e isso é um avanço civilizacional inegável. Mas também tempos em que essa mesma dor, em vez de ser alicerce para superação, se transformou em moeda de troca. Uma moeda que compra isenção de culpa, atenções desmedidas e até poder. Aqui, não se discute a legitimidade do sofrimento alheio — isso seria cínico. Discute-se, sim, a forma como ele é instrumentalizado, por indivíduos e instituições, até se esvaziar de sentido.  

A fragilidade emocional deixou de ser uma condição a superar para passar a ser uma identidade a cultivar. Qualquer diferença — seja de competência, aspecto físico ou orientação sexual — é agora potencial gatilho para dramas inflacionados. O problema não está em reconhecer essas diferenças, mas em transformá-las em feridas perpétuas, incapazes de cicatrizar. O que era para ser consciência social tornou-se, em muitos casos, uma indústria. Uma indústria que alimenta narrativas políticas, movimenta mercados de autoajuda barata e justifica a erosão de valores como mérito e responsabilidade.  

Há, claro, quem legitime este fenómeno como "progresso". Dizem que as pessoas não estão mais frágeis, apenas mais conscientes. E há verdade nisto — mas só até certo ponto. Consciência sem resiliência é como diagnóstico sem tratamento: paralisa em vez de libertar. Quando qualquer obstáculo vira "trauma" e qualquer opinião contrária vira "violência", não estamos a criar cidadãos fortes. Estamos a criar dependentes emocionais, eternamente à espera que o mundo se curve às suas fragilidades.  

Pior ainda é quando esta mentalidade é aproveitada por agendas políticas e económicas. A esquerda radical usa-a para silenciar dissidências, rotulando críticas como "opressão". A direita reacionária, por sua vez, aproveita-se do exagero para descredibilizar causas legítimas. E no meio disto tudo, o cidadão comum — aquele que enfrenta adversidades reais sem alarde — fica sem linguagem para se expressar. Ou se junta ao coro dos ofendidos perpétuos, ou é crucificado como "insensível".  

Não se trata, repito, de negar o sofrimento alheio. Trata-se de recusar a sua banalização. Uma sociedade que glorifica a vulnerabilidade como virtude suprema está a caminhar para a infantilização colectiva. O equilíbrio está em reconhecer as dificuldades sem as eternizar, em dar voz aos fracos sem enfraquecer os fortes, e em entender que a verdadeira justiça social não se faz com muletas, mas com ferramentas.  

O desafio, então, é este: como honrar a dor sem a transformar em negócio? Como ser compassivo sem ser cúmplice da própria decadência? A resposta não está no extremo do cinismo nem no do protecionismo ingénuo. Está no meio — onde as pessoas são tratadas como adultas, capazes de enfrentar a vida sem precisar que o mundo lhes peça desculpa por ela existir.

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publicado às 06:56

Vidas Marvel

por LucyHare, em 04.07.25

A imagem projetada e a substância real.

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Muita gente vive como um teaser da Marvel—cenas de ação cortadas, frases de efeito, um visual impecável—mas quando vais assistir ao "longa-metragem" (ou seja, conheces a fundo a pessoa, as suas conquistas, os seus valores), percebes que o roteiro é raso. Falta profundidade nas ideias, nas conversas, nos objetivos. Os efeitos especiais são a única atração: aparência, status, poses para redes sociais. E o vilão é genérico—dramas superficiais, problemas que nunca evoluem.  

Algumas pessoas constroem um verdadeiro "MCU (Multiverso da Carência Única)" à sua volta. São vários "filmes" (fases da vida) que não se conectam—começam mil projetos, mas não terminam nada. Criam spin-offs sem graça: falam muito de "planos épicos", mas não executam o básico. E ainda espalham easter eggs de autossabotagem—prometem mudanças, mas repetem sempre os mesmos erros.  

Por que é que isto acontece? Vivemos numa cultura do hype (do exagero), que valoriza mais o marketing pessoal (aparência) do que a consistência. Há um medo do fracasso—é mais fácil parecer interessante do que correr riscos reais. E a comparação com os outros não ajuda: as pessoas querem ser "os heróis" da própria história, mas sem passar pelas dificuldades necessárias.  

Como fugir deste roteiro? Se percebes isto nos outros (ou em ti mesmo), vale a pena refletir. Troca o ilusão por conteúdo real—investe em habilidades, conhecimento e autoconhecimento. Assume o teu "filme independente"—nem toda a gente precisa de ser um blockbuster (superprodução), pequenas metragens, mas sinceras, também são valiosas. E corta os post-credits scenes falsos—pára de viver de promessas e glimpses do que "poderia ser".  

No fundo, a vida não é um filme da Marvel—até porque, nela, não temos roteiristas para nos salvar no terceiro ato. O que importa é o longa-metragem que estás a dirigir, não o trailer que publicas no TikTok ou Instagram.  

Se fosses um filme, a tua vida seria um drama indie de culto ou um blockbuster vazio? 🎬

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publicado às 10:11

Novo Evangelho Segundo a Máquina 

por LucyHare, em 03.07.25

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Há um deus novo, mas não tem rosto — apenas um feed infinito, um scroll que não acaba. Chama-se Algoritmo, e os seus profetas são influencers de sorrisos comprados, vendendo salvação em packs de subscrição. Os seus mandamentos estão escritos nos terms and conditions que ninguém lê, mas todos aceitam. O primeiro deles é claro:

Não terás outros deuses diante de mim.

E nós, obedientes, baixamos a cabeça e clicamos.  

Os templos já não têm velas, têm pixels. A comunhão não é feita de pão e vinho, mas de likes e shares. A confissão não acontece em segredo, mas em stories de 24 horas, onde expomos os nossos pecados em troca de views. O inferno não é fogo, é buffer loading. O céu não é eterno, é uma cloud que um dia se desfaz.  

Os pobres são background noise os velhos são bugs no sistema, e os humildes? Esses estão offline, fantasmas esquecidos num mundo que só valoriza quem grita mais alto. Enquanto isso, Josué já não conquista terras — conquista followers. A glória não é feita de actos, mas de engagement. A verdade não é absoluta, é viral.  

E nós, os fiéis desta nova fé, scrollamos até à exaustão, até os olhos doerem, até o sono chegar. Mas mesmo adormecidos, os dedos ainda se movem, procurando mais, sempre mais. Porque o pior não é estarmos sozinhos. O pior é estarmos sozinhos e mesmo assim sentirmos que nunca estamos quietos.  

E no meio deste ruído, há silêncios que doem mais do que gritos.  

— O livro fechado na estante.  

— A conversa que não acontece porque os olhos estão presos no smartphone.  

— O velho no banco do jardim, invisível para quem passa com airpods nos ouvidos.  

O vento ainda canta nos fios elétricos, mas já ninguém ouve. Os deuses antigos morreram, e os novos não nos salvam — só nos distraem  

E quando a bateria acaba, ficamos frente a frente com o vazio.  

E percebemos, demasiado tarde, que a única coisa que realmente possuímos é o tempo que desperdiçamos.

#Amen 🔄

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publicado às 21:21

Gargantas Apertadas e Almas sem Travão

por LucyHare, em 03.07.25

    A Arte de Ser Um Problema Delicioso

Há sempre quem não nos engula — seja por inveja, incompreensão ou simplesmente porque ocupamos um espaço que lhes faz cócegas na consciência. Mas a verdade é que nenhuma garganta alheia deveria ditar o tamanho da nossa voz. Se alguém sente que não nos "consegue digerir", talvez o problema não esteja no sabor da nossa essência, mas nos limites do seu paladar.  

A água que sugerimos que bebam? É metáfora para fluidez, para a capacidade de se adaptarem ao que é diferente sem engasgarem com os próprios preconceitos. Porque o que realmente fica atravessado na garganta da sociedade não são as pessoas que desafiam o status quo, mas sim os ossos duros do orgulho, os espinhos da intolerância.  

E se há quem insista em não nos engolir, que pelo menos não nos mastiguem em silêncio. Porque até na crítica ou na indireta, há uma oportunidade de diálogo — ou então, quem sabe, de riso. Afinal, o humor é o mel que suaviza até as goelas mais apertadas. E no fim, mais vale ser um sabor intenso que recusam do que um aftertaste esquecível que todos consomem sem pestanejar.  

A vida não é um concurso de popularidade, é um banquete. E quem só sabe engolir o que já conhece, condena-se a uma dieta de lugares-comuns. Enquanto isso, nós, os supostos "indigeríveis", seguimos a temperar a existência com o que eles chamam de "exagero" e nós chamamos de 'existência em bold'.

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publicado às 09:59

A Grande Encenação Digital

por LucyHare, em 02.07.25

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Nós, os nobres plebeus da era digital, transformamos as nossas vidas em espetáculos contínuos, onde cada momento íntimo se converte em palco e plateia. Já não choramos em travesseiros - choramos em stories, com iluminação profissional e trilha sonora dramática. O café solitário da manhã, antes um simples ritual privado, agora exige curadoria: o ângulo perfeito, o filtro que esconde as olheiras, a legenda que oscila entre a falsa modéstia e o desespero por validação.

Inventamos uma nova linguagem do coração, onde emojis substituem palavras e hashtags resumem estados de alma. "Estou devastado" cabe perfeitamente em 280 caracteres, acompanhado de uma selfie onde o rosto, mesmo triste, segue as regras de composição estética. A tristeza tornou-se produto, a solidão transformou-se em conteúdo, e o vazio existencial agora tem métricas de engajamento.

A ironia mais pungente? Quanto mais expomos, menos nos revelamos. Criamos personagens tão elaborados que já nem nós mesmos sabemos onde termina a performance e começa o ser. Compartilhamos tudo - exceto aquilo que realmente importa. Conectamo-nos incessantemente, enquanto o verdadeiro contato humano se torna artigo raro.

Neste grande teatro das redes sociais, somos simultaneamente atores e espectadores de nós mesmos, presos num loop infinito de encenação e consumo. A pergunta que fica, ecoando no vazio entre um post e outro: quem seríamos se ninguém estivesse olhando? Quem seremos quando a plateia digital finalmente se cansar do espetáculo?

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publicado às 23:55

 

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Oh! Descartes, pobre filósofo!

Se ressuscitasses hoje, ias ter um burnout digital em cinco minutos. Já te estou a imaginar a tentar atualizares o teu famoso "Penso, logo existo" para os tempos modernos:  

"Publico, logo existo. Se não tiver engajamento, sou um ghost account da filosofia." 

Vivemos na era em que uma selfie mal-encarada no Instagram vale mais do que um tratado sobre a natureza da consciência. Um influencer que vende chá detox tem mais autoridade existencial do que um professor catedrático — porque, convenhamos, quantos followers tem o Kant em 2025? Exatamente - Shadowbanned pela história..

E o que dizer das nossas performances existenciais diárias?  

- Manhãs: Acordar e conferir se os likes noturnos validaram a nossa alma (ou pelo menos o nosso outfit).  

- Tardes: Partilhar um meme deep para parecer inteligente, enquanto comemos cereais diretamente da embalagem.  

- Noites: Perguntar-nos em dark mode: "Se apagar a minha conta, serei como um unicórnio? Uma lenda que ninguém screenshotou?"

Até as nossas crises existenciais são aesthetic agora. Antes, questionávamos o sentido da vida; hoje, questionamos por que o algoritmo não nos mostra aos crushes. Antes, temíamos a morte; hoje, tememos o "Se esta conta for desativada, você tem 30 dias para se arrepender."

E assim caminha a humanidade. Tenho followers, logo sou alguém. Tenho blue check, logo sou alguém alguém. Se ficar sem bateria, desapareço no limbo dos offline.😱

No final, só nos resta a grande questão do século XXI: Se um post cai no feed e ninguém o vê, ele fez algodão doce de likes?

Esta reflexão foi patrocinada pela necessidade de validação constante. Partilhem por favor, para eu me sentir viva...Comentem também para eu saber que existo. E follow-me, para a minha autoestima não crashar

Sabem, é que marketplace das ideias, ou és viral ou és apagado pela nostalgia dos anos 90.

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publicado às 22:43


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